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Oportunidades e desafios na Amazônia Azul




Capitão de Mar e Guerra Frederico Antonio Saraiva Nogueira, representante suplente da Marinha no Cembra – Imagem: Cembra.

Fonte: Agência Marinha de Notícias
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No último sábado (8), celebrou-se o Dia Mundial dos Oceanos. A cada ano, a data representa uma oportunidade para que, internacionalmente, os assuntos relacionados ao mar sejam relembrados e tenham sua importância enfatizada. No Brasil, devido ao extenso litoral, isso se torna ainda mais relevante.

Nesse contexto, destaca-se o papel desempenhado pelo Centro de Excelência para o Mar Brasileiro (Cembra) que, este ano, completa 15 anos de criação. Organização sem fins lucrativos, o Cembra é responsável por estimular, propor, coordenar e conduzir ações e projetos relacionados ao estudo e ao aproveitamento da Amazônia Azul.

Em celebração ao Dia Mundial dos Oceanos e com o intuito de ampliar a visão do público sobre a importância do mar para o Brasil, a Agência Marinha de Notícias entrevistou o representante suplente da Marinha no Cembra, Capitão de Mar e Guerra (CMG) da Reserva, Frederico Antonio Saraiva Nogueira. Entre outros assuntos, o entrevistado deu detalhes sobre a criação do Cembra e apresentou iniciativas que buscam incrementar os conhecimentos da população brasileira sobre o mar. Confira a seguir!

AgMN – Qual é a importância de uma data como o Dia Mundial dos Oceanos?

CMG Frederico Nogueira – O Dia Mundial dos Oceanos, celebrado anualmente em 8 de junho, foi oficialmente estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2008, porém, sua proposta ocorreu em 1992, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro (RJ). A data pretende lembrar a importância dos oceanos na vida de todos os cidadãos e na preservação do planeta. Ocupando 71% da superfície da Terra, os oceanos fornecem alimento e oxigênio, e sustentam também boa parte da biodiversidade e da atividade econômica internacional, além de serem um fator determinante para a minimização do aquecimento global, sendo, portanto, o grande regulador térmico do planeta.

Infelizmente, mesmo com melhorias nas ações de gestão e conservação, a Primeira Avaliação Global Integrada das Nações Unidas sobre o Ambiente Marinho concluiu que grande parte dos oceanos está, agora, seriamente degradada. Considerando que a população mundial atingirá cerca de 9 bilhões de pessoas até 2050, os impactos nos oceanos, associados às atividades humanas, tendem a aumentar.

AgMN – O que pode ser feito para minimizar esses impactos?

CMG Frederico Nogueira – Para reverter esse quadro, ou pelo menos mitigar seus efeitos, faz-se necessário e urgente aumentar a conscientização sobre as práticas sustentáveis no uso do oceano. Isso está alinhado com a missão de entidades como o Cembra, que visa despertar o interesse e promover ações concretas para o aproveitamento das potencialidades da Amazônia Azul.

A própria criação do Centro é resultado de iniciativas para compreender o oceano. Em 1998, durante a comemoração do Ano Internacional dos Oceanos, a ONU criou a Comissão Mundial Independente sobre os Oceanos (CMIO). Por estímulo da CMIO, que considerou desejável a formação de comissões assessoras nacionais dos países nela representados, foi criada, no Brasil, a Comissão Nacional Independente sobre os Oceanos (CNIO).

Com a extinção da CMIO, após o encaminhamento do Relatório à Assembleia Geral das Nações Unidas, a CNIO teve o mesmo destino. Entretanto, antes de encerrar suas atividades, considerando os numerosos subsídios coletados durante seu funcionamento, a CNIO decidiu organizar um documento de cunho executivo que, a par de sua utilidade a todos os estudiosos e interessados em atividades marinhas, fosse destinado, prioritariamente, às lideranças públicas do País – os tomadores de decisão. Esse documento  constituiu-se na primeira edição do livro “O Brasil e o Mar no Século XXI – Relatório aos Tomadores de Decisão do País”, que hoje está em sua terceira edição, sob o título “O Brasil e o Mar no Século XXI – Subsídios para o aproveitamento sustentável do Mar Brasileiro”, disponível neste endereço.

Depois do lançamento da primeira edição do livro e da extinção da CNIO, com o passar dos anos, começou a aumentar a preocupação dos membros remanescentes da Comissão com a necessidade de lançar uma segunda edição da obra, a fim de evitar que se perdesse todo o esforço inicialmente desenvolvido, devido à desatualização. Era de todo conveniente que alguma entidade do País assumisse a empreitada. Após uma sequência de entendimentos com o Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE/UFRJ), mais especificamente com o Espaço Centros e Redes de Excelência (Ecentex), logo percebeu-se que, além da segunda edição, era necessário considerar um objetivo mais amplo, no tempo e na abrangência. Começou aí o surgimento do Cembra.

AgMN – Estamos em plena Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, proposta pelas Nações Unidas. Com início em 2021, a “Década” estende-se até 2030. Como o Brasil está atuando nesse contexto? E como o Cembra se insere nele?

CMG Frederico Nogueira – Ainda em março de 2020, a então Secretaria de Pesquisa e Formação Científica do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI/SEPEF), hoje Secretaria de Políticas e Programas Estratégicos (SEPPE), empenhou-se em dar continuidade à implementação, no Brasil, da Década do Oceano, iniciada com o Workshop Regional para o Atlântico Sul. Para isso, foi instituído, em 8 de março de 2021, um Comitê de Assessoramento para a Década da Ciência Oceânica, com a tarefa inicial de organizar uma série de Oficinas Subnacionais, com o propósito de colher subsídios para o Plano Nacional de Implementação.

O Comitê Nacional de Assessoramento para a Década da Ciência Oceânica foi reconhecido pela Comissão Oceanográfica Intergovernamental (COI) como Brazilian National Committee (Comitê Nacional Brasileiro), na forma definida pelo Decade Implementation Plan (Plano de Implementação da Década). O Brasil foi o primeiro Estado-Membro da COI a obter esse reconhecimento. O Comitê Nacional conta com a participação do MCTI/SEPPE, da Marinha do Brasil, por meio da Diretoria de Hidrografia e Navegação, além de diversos outros atores.

AgMN – Qual é o objetivo do Comitê Nacional?

CMG Frederico Nogueira – O propósito inicial desse comitê foi a elaboração do Plano Nacional para a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável. Esse plano, aprovado em novembro de 2021, é o principal instrumento para planejar as ações que serão executadas ao longo da “Década”, para termos “o oceano que queremos”.

A “Década” está agora em seu quarto ano de implementação, e seu portfólio de Ações continua crescendo rapidamente, com 52 programas, mais de 320 projetos e 99 Contribuições da Década (Decade Contributions), agora endossados. Vale enfatizar o surgimento de uma rede crescente de estruturas de coordenação descentralizadas, regionais e temáticas, para apoiar o trabalho da Unidade de Coordenação da Década (IOC Secretariat), e lembrar que seus 39 Comitês Nacionais estão agora operacionais.

AgMN – Ainda no contexto da Década da Ciência Oceânica, quais serão os próximos passos?

CMG Frederico Nogueira – As prioridades para a “Década”, durante os próximos 12 a 18 meses, serão orientadas pelos resultados do processo Visão 2030 e da Declaração de Barcelona. Leia mais aqui.

Convém lembrar que o ano de 2025 marca o ponto médio da implementação da Década dos Oceanos e, ainda neste ano, terá início o “processo de avaliação de meia vida” (vamos chamá-lo assim), a fim de abordar o primeiro objetivo de revisão, qual seja, rever as estruturas, processos, parcerias e recursos que sustentam a condução da Década do Oceano, e fazer as recomendações pertinentes para otimizar o seu impacto.

Nos próximos dez anos, teremos uma enorme oportunidade de aproveitar os avanços da ciência para alcançar uma melhor compreensão sobre o sistema oceânico. Isso permitirá o fornecimento de informações oportunas sobre a situação destes, e possibilitará a articulação de cenários e caminhos integrados para o desenvolvimento sustentável.

O Cembra vem priorizando diversas iniciativas em prol da Década do Oceano. Podemos citar, por exemplo, a organização do 1º Concurso de Redação, que teve como tema: “A Década do Oceano – qual a sua visão sobre ‘o oceano que queremos?”, para alunos do Ensino Fundamental, Médio e Superior; a promoção do Webinário Internacional sobre Submersíveis, reconhecido pela COI como atividade da Década do Oceano; a edição de um número especial do Informativo Cembra, com textos somente sobre o tema e, nas edições seguintes, a inclusão de ao menos uma matéria sobre o assunto. Já foram publicadas as edições 13, 14 e 15 do informativo (www.cembra.org.br/index.php/informativo-cembra), além de implementarmos o Plano de Comunicação, com estratégias para divulgar de forma acessível o conhecimento sobre o mar.

AgMN – Qual é o objetivo central do Centro?

CMG Frederico Nogueira – O nosso objetivo é trazer o cidadão comum mais para perto do mar, seja pelo aumento de conhecimentos e, principalmente, pela conscientização de sua importância. Para o próximo semestre, continuaremos oferecendo mais conteúdos de entrevista em formato podcast, palestras on-line pelo YouTube, e ainda promover o 1º Concurso de Vídeos Curtos do Cembra, para os alunos da Fundação de Estudos do Mar (Femar).

AgMN – Quais atividades do Cembra foram realizadas em 2024 até o momento? E quais são as perspectivas para o segundo semestre?

CMG Frederico Nogueira – Neste ano de 2024, promovemos diversas atividades para mostrar à sociedade a importância do mar brasileiro para o desenvolvimento sustentável de nossa economia. Podemos ressaltar o lançamento do 2º Concurso de Redação do Cembra, no último dia 8 de junho, que tem como tema o “Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira (LEPLAC) – O Trabalho dos ‘Bandeirantes das Longitudes Salgadas’, voltado para a definição da fronteira leste do Brasil”.

Podemos destacar, também, os seis episódios do PodMar, o primeiro podcast do Brasil dedicado ao assunto, com temas relevantes para o público, como a preocupação com a poluição plástica no oceano, o aumento do nível do mar em cidades brasileiras e o trabalho que vem sendo exercido para ampliar as fronteiras do País no mar, além de o episódio sobre a Década do Oceano ser a entrevista de abertura. Além disso, estamos organizando, todos os meses, palestras on-line de curta duração, transmitidas ao vivo pelo nosso canal no YouTube. No próximo dia 17 de junho, o tema será o Planejamento Espacial Marinho, e estão todos convidados a participar desse evento. Todas essas informações estão disponíveis no site do Cembra.

AgMN – Como avalia a mentalidade marítima entre a população brasileira? Por que é importante que esta questão seja difundida?

CMG Frederico Nogueira – Na pesquisa de opinião pública mais recente sobre as atividades que ocorrem no mar, disponível na 3ª edição da obra “O Brasil e o Mar no Século XXI”, foi possível observar que o cidadão comum brasileiro não tem uma mentalidade marítima satisfatória e carece de melhor compreensão sobre os aspectos econômicos, científicos, ambientais e de soberania na Amazônia Azul. O significado econômico e estratégico do mar ainda é novidade para muitos brasileiros.

É importante ressaltar alguns números sobre o mar brasileiro. É pela Amazônia Azul que trafega mais de 95% de nosso comércio exterior, é produzido cerca de 95% do petróleo nacional e 85% do gás natural, além de 99% do tráfego de dados nacionais ser feito por cabos submarinos instalados no Oceano Atlântico. O mar brasileiro é, ainda, fonte de recursos vivos, minerais e sítios ambientais, sem falar nos portos, centros industriais e de energia, vitais para a economia do Brasil. Essas informações precisam chegar à sociedade, para que, cada vez mais, se conheça o potencial que uma nação marítima tem no âmbito da Economia Azul, e trabalhar para um futuro sustentável com recursos para as próximas gerações. Na edição nº 15 do Informativo Cembra, falamos sobre os desafios de divulgar os assuntos ligados ao Mar.

Fonte: Agência Marinha de Notícias
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