Itaipu-Niterói, 28 agosto 2023
Lá pelo final dos anos 80, num encontro com meu amigo Maurillo Vinhas de Queiroz (engenheiro naval), mostrou-me o projeto de um veleiro de 20′ cabinado, para quatro pessoas que, queria construir.
Deve ter vindo falar comigo porque na época, o Cristiano Pontes e eu estávamos fabricando o veleiro Pinguim na nossa fábrica, Innovator.
Minha esposa Lúcia, então chefe da tropa escoteira do 7º Gemar (Jurujuba), num dia de tarefas, observava o escaler “Velho Lobo” em mau estado de conservação, quando o chefe do sétimo Gemar, Nelson Carvalho disse-lhe precisar de alguém que fizesse os reparos. Ela comentou que eu fazia esse tipo de serviço. De alguma forma essa informação chegou aos ouvidos do Comte. Carlos Borba (então presidente nacional da modalidade escoteiros do mar) através da chefe Maria Pérola, do Quarto Gemar. O Comte. Borba veio nos procurar e marcamos um encontro no Iate Clube do Rio de Janeiro. Na reunião estavam presentes o Maurillo, Cristiano, Comte. Borba e eu. O Comte. Borba expôs a necessidade de desenvolver um veleiro escola para a formação pedagógica dos Escoteiros do Mar. Nesse momento, nascia o “Sea Scout”, um veleiro de 20′ (6 metros) para uma tripulação de 7 pessoas, sendo um monitor e seis alunos.
Com apoio da Marinha de Guerra do Brasil, conseguimos fabricar 7 veleiros, considerados um sucesso. Veio o plano Collor e nossos sonhos vieram abaixo numa contenção de despesas que não conseguimos superar.
Passaram-se longos anos mas a ideia nunca se apagou. Juntos, com a coordenação do Comte. Borba, Cristiano e eu, reunimos em 2008, um grupo de aproximadamente 80 pessoas para a criação do RUMAR – Instituto Rumo ao Mar. O RUMAR teria como missão, promover o fortalecimento da mentalidade marítima dos brasileiros e para alcançar esse fim, deveria disseminar os Sea Scout’s ao longo do litoral brasileiro e águas interiores navegáveis.
No final do ano passado (2022), surgiu no cenário, a Associação Barreiros que comprando nossa ideia, proporcionou uma verba para a construção de um protótipo que iria viabilizar o antigo sonho. Depois de muitas idas e vindas conseguimos um casco com o plano original do Sea Scout que vinha sendo usado como embarcação de apoio. Partimos então a procura de um local para fazer a reforma do veleiro escola. Conseguimos finalmente um pequeno espaço a céu aberto no pátio do Iate Clube do Rio de Janeiro, autorizado pelo Comodoro José Roberto Braile (Pré).
Começou a nossa terrível saga, com um período de chuvas torrenciais que não paravam e alternativamente, um sol inclemente que nos obrigava a aguardar o final da tarde para na sombra, podermos trabalhar. Aguardamos inicialmente a construção da carreta pelo Márcio Tavares, carpinteiro naval, filho de um amigo que já se foi, o Carpinteiro Naval Aldenir Costa Santos (Maranhão), para colocar o barco em seco.
Com essas etapas alcançadas, abrimos o convés para descobrir que todos os reforços estruturais estavam comprometidos, podres e contaminados com água salgada. Foi um banho de água fria. Mas, o que estava combinado não tinha volta e demos continuidade aos serviços, utilizando materiais da empresa Tecpox e apoio da Barracuda. Com entrega de placas de Divinicell, fomos desenvolvendo a minha ideia de transformação do convés do Sea Scout em uma embarcação mais versátil, melhor adaptada ao fim que se propunha. No meio dessa faina, descobri uma doença incapacitante, que procurei superar a duras penas. Como as ideias estavam todas em minha cabeça, foi difícil explicar as modificações (para mim é fácil, consigo visualizar no espaço). Uma grande parte das peças, precisei fabricar pessoalmente. O tempo era exíguo e precisava estar o maior tempo possível presente para expor o que precisava ser feito. Por vezes, fabricando as peças em casa, precisava sentar para recuperar minhas poucas forças. Incentivado pelo Cristiano com sua inabalável fé em mim, do amigo José Waldir de Souza Lima (Filé), do Manuel Oliveira, inquebrantável companheiro de lutas nos nossos serviços de manutenção de veleiros, do Rubem Silva (Pechincha) e o total apoio de minha esposa, sem a qual nada seria possível, continuamos em frente. Diria que foram heróis. Conseguimos a toque de caixa, terminar nas últimas badaladas do sino, a tão desejada obra. A apresentação do veleiro foi feita no CIAGA, no dia 11 de Julho 2023, com apoio do Almirante Mauro Cesar e daquela corporação.
Na cerimônia, foram feitas as devidas explicações do veleiro e das modificações propostas, com diversas autoridades presentes. Em seguida, o veleiro foi transportado para Ilhabela onde ficou em exposição para visitação pública num espaço da Marinha e da Prefeitura, durante a semana de vela de Ilhabela. Na sequencia, o veleiro foi transferido para as instalações da Associação Barreiros (principal patrocinadora do Projeto), onde foram executados os testes em conjunto com a Escola MM Náutica de Ilhabela do professor Marcos Levy e Mônica Montilha, para homologação das transformações propostas. Todas as modificações foram aprovadas com louvor: teste de adernamento, utilização do motor situado no meio do cokpit, utilização sincronizada dos remos e do inovador sistema do leme. Foi uma bela velejada proporcionada pelas velas elaboradas pela “Quantum Sails”, Porto Alegre – Brasil, cujo proprietário as forneceu gratuitamente. Os testes foram realizados na presença do Cristiano, do Engenheiro Naval Glauter Moreira, responsável por fazer o plano de linhas e convés definitivos, para as futuras embarcações e, do professor Marcos junto a seus colaboradores, com a participação ativa nos testes dos proprietários da Associação Barreiros.
Günther Sergio Müller é pioneiro na fabricação de barcos em fibra de vidro no Brasil, Sócio Fundador do RUMAR e coordena o Projeto do Barco Escola.
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