Expedições

Beto Pandiani em Vancouver na Rota Polar

Acordei com a deliciosa música da chuva em nosso motorhome.

Agora são 2:50 da madrugada, no Brasil 6:50. Todos dormem em suas camas exaustos, para mim sobrou o sofá da sala, e meio desajeitado tento me acomodar. Isso que dá para quem tem 2 metros de altura. Estamos aqui em Vancouver em um lugar próprio para motorhomes, e estamos cercados de pelo menos uns 100. A maioria são moradores que encontram um jeito mais barato de viver.

Logo que amanhecer vamos pegar o barco que ficou na casa do Martin, o nosso apoio aqui no Canadá, e vamos seguir para o Norte. Quem sabe conseguiremos andar uns 400 kms. Estamos pesados e muito longos, por isso andamos em uma média de 50kms por hora. Vida de caminhoneiro. Levar este barco até o Oceano Ártico já é um desafio, navegá-lo é mais ainda, sabendo que este ano o degelo está atrasado. Se estivéssemos agora em Tuk precisaríamos esperar.

Agora começo a lembrar de tudo que me trouxe até aqui. As primeiras velejadas em um Hobiecat 14 pés do meu querido amigo Luiz Carlos M. Andrade no meio dos anos 70. Em 1982 com outro amigo especial, o Maurício Medeiros, compramos o nosso primeiro barco, um antigo Hobiecat 16 pés. Hobiecat é a marca de um catamarã (barco de dois cascos) que se tornou um ícone no mundo. Depois vieram as regatas, e durante quase 11 anos mergulhei no mundo das competições. Tive um desenvolvimento rápido e em 1989 junto com a Uli Heuchert vencemos o Campeonato Norte-americano de HC 16. Esta vitória me impulsionou pois a minha auto confiança aumentou muito e eu passei a perceber que eu havia aprendido muito sobre como velejar bem nestes pequenos e velozes barcos extraindo o máximo.Em 1993 encontrei na rua o querido Marcus Sulzbacher e o resultado foi realizarmos juntos a Entre Trópicos, Miami à Ilhabela em 2 HC 21 pés.

Esta viagem durou 289 dias, e foi também a descoberta de um modo de vida mais simples e minimalista, pois passar tanto tempo em um barco aberto requer muito desprendimento. Nos anos seguintes vieram a Rota Austral com os queridos amigos Gui von Schmidt, Felipe Tommazzi e Santiago Iza. Puerto Montt ao Rio de Janeiro via Cabo Horn, 170 dias. Uma viagem duríssima e fria por uma das regiões mais ventosas do mundo.Em 2003 Ushuaia à Antártica com o veleiro Kotic de apoio. Foi neste momento que fiquei amigo do Igor Bely, pois era no barco que nos apoiou que ele sempre viveu. Tive como companheiro o Duncan Ross, um grande amigo Sul Africano que também foi meu companheiro de barco na primeira viagem.

Cruzar o Drake e chegar na Antártica foi um salto qualitativo na logística e na preparação desta improvável viagem. Desta intensa experiência nasceu uma grande amizade com o Oleg e a Sophie Bely, os pais do Igor.No ano seguinte o Duncan e eu fizemos a Atlantic 1000 milhas pela costa Leste americana. A regata mais longa do planeta para catamarãs pequenos.Em 2005 o também querido Felipe Whitaker e eu fizemos a Rota Boreal, NY à Groenlândia. Foram 90 dias por uma lindíssima região do planeta. Viagem gelada com muita neblina.

Em 2008, com o meu grande companheiro de viagem Igor, cruzamos o Oceano Pacífico desde Vina del Mar no Chile até a Austrália. Viagem dificílima com muitas quebras. Nosso grande recorde foi chegarmos mais amigos depois de 17 mil quilômetros sem nunca discutirmos mesmo sob uma intensa pressão emocional.

Em 2013 finalmente nós 2 cruzamos o Oceano Atlântico desde Capetown até Ilhabela. 37 dias sem escalas em um catamaran de 25 pés não é algo muito comum. Aprendemos muito sobre resiliência. Não posso deixar de mencionar os fotógrafos que tbm são amigos especiais. Roberto Linsker, André Andrade, Júlio Fiadi, Thomas Scheidt, e Maristela Colucci. O resultado de tudo são 7 livros publicados. (No Linktree é possível encontrá-los, assim como o site das sete viagens passadas)Agora o Igor e eu estamos juntos escrevendo um novo livro, a Rota Polar, e temos como companheiros de viagem os documentaristas Alberto Andrich e Alexandre Socci.

Desta vez além do desafio a própria viagem temos que voltar com uma história consistente Sobre o que ocorre na nossa Calota Polar. Quero agradecer ao Sylvio Rocha, amigo e produtor do filme, ao Gui Stokler roteirista, a Adriana namorada do Igor e ao Christian nosso coordenador do projeto. Agradeço a todos pelo apoio, em especial a minha família, meus queridos primos.Neste momento de reflexão passa um filme na cabeça sobre muitas coisas que passaram, e me questiono. O que ficou? Entendo que o maior aprendizado que tive nestes anos todos foi CONFIAR. Deixo aqui esta reflexão. O que é possível construir na vida sem confiança?

Um grande abraço Beto Pandiani

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