1- Desde quando surgiu essa paixão pelo mar?
R: Eu nasci na praia de Copacabana e sempre peguei onda na praia. Meu pai levava a mim e meus irmãos para pescar desde muito cedo na Urca, Recreio e Ipanema. Então, acho que a paixão pelo mar surgiu daí e, quando eu tinha 16 anos, tive o “click” de ser biólogo marinho por causa do filme do “007 – O espião que me amava”, onde o agente James Bond se passava por um biólogo marinho, identificava os peixes pelos nomes científicos. Eu também já fazia pesca submarina e sabia identificar os peixes, na prática, pelo nome vulgar. Então, houve essa conciliação da prática com a ciência que me captou e por isso eu resolvi fazer Biologia Marinha na UFRJ.
2- Cada vez mais a sociedade vem tomando ciência da quantidade de plástico acumulada nos mares e oceanos. Algumas medidas tímidas foram tomadas como a proibição de canudos de plástico aqui no Rio de Janeiro. O que seria mais importante nesse momento, na sua opinião, e o que pode ser feito, a curto e médio prazos, para melhorar a saúde de nossos mares e oceanos?
R: A questão do plástico é a educação. Primeiro, é conscientizar da necessidade do correto descarte do plástico, pois o plástico não é o problema e sim como ele é descartado. A sociedade vem descartando direto nas praias, nos oceanos, nos rios… o que acaba causando uma enorme mortalidade de seres marinhos e esse é o grande problema, além da poluição visual e por outras substâncias. Acho que a solução no curto, médio prazo, é a educação da sociedade da necessidade de se descartar, não só o plástico, mas todo o lixo que a gente gera. Ou seja, descartar de forma correta, dar a destinação correta e tratamento correto desse lixo. Isso é fundamental e se não viermos a fazer isso, com certeza teremos problema.
3- O senhor já publicou vários livros, fez várias palestras e já participou de diversos programas e entrevistas na mídia. Percebe um real engajamento da mídia nas questões ambientais e, em particular, nas relativas à nossa fauna marinha?
R: Eu acho que a mídia vem participando de uma forma muito mais ativa nos últimos anos. Eu participei ativamente da ECO 92 e nessa época não se tinha uma noção do que era ecologia, meio ambiente, conservação da natureza etc. De lá para cá, houve um envolvimento muito grande da sociedade e da mídia em geral nessas questões. Tanto é que, hoje, dificilmente não tem uma matéria sobre meio ambiente nos jornais diários. Então, com certeza, a mídia vem falando bastante, vem ajudando para que as pessoas tomem ciência e queiram preservar a natureza.
4- Sendo o idealizador do AquaRio, o senhor poderia nos contar como foi todo o processo desde sua idealização até a sua realização de fato?
R: Em 2005 eu criei um projeto de preservação de tubarões e vi a necessidade de uma interação grande com eles, como o Projeto Tamar tinha com as tartarugas, só que levar as pessoas para mergulhar com os tubarões como eu fazia, é claro que é muito difícil. Daí, surgiu a ideia do aquário, quer dizer, trazer os tubarões para as pessoas. A partir daí, foi um trabalho grande porque eu sempre entendi que o aquário tinha que ser privado e, em 2007, eu consegui a cessão do terreno onde foi construído o prédio do aquário e foram alguns anos para viabilizá-lo financeiramente. Em 2012, com a parceria do Grupo Catarata, a gente conseguiu viabilizar a construção que se deu em quatro anos, inaugurando o aquário em novembro de 2016.
5- Como é administrar o maior aquário da América do Sul, que contém mais de quatro milhões de litros de água salgada e milhares de espécies marinhas?
R: O aquário nasceu, da forma idealizada por mim, focado em educação, pesquisa e conservação. Então, o mais importante de tudo é esse tripé para que ele seja um bom aquário. Claro que é um local de entretenimento, lazer e turismo e, por ser privado, ele precisa de receita suficiente para se manter funcionando. Administrar o maior aquário da América do Sul é fazer um bom trabalho porque estando ele no Rio de Janeiro, na região do Porto Maravilha, com certeza a visitação é bem grande, a gente tem um sucesso de visitação. No primeiro ano nós tivemos um milhão e meio de pessoas visitando o aquário, o que mostra total sucesso junto ao público.
6- De que maneira os animais foram levados para o AquaRio?
R: O aquário só tem peixes e invertebrados marinhos. Não tem e provavelmente não vai ter mamíferos marinhos. Noventa porcento dos habitantes do aquário são os mesmos que são ofertados nas peixarias e supermercados para a alimentação humana. Esses peixes foram capturados na natureza e levados para o aquário, e a gente conseguiu o número de 100% de sobrevivência dos animais desde sua captura até o transporte para o aquário. A nossa taxa de mortalidade do AquaRio é uma das mais baixas do mundo e foi o primeiro aquário do Brasil a ter a certificação de “Bem-estar animal”. Então, a gente tem todo cuidado, respeito à vida dos animais, por isso eles sobrevivem e até se reproduzem no aquário. Temos também pesquisa de reprodução e o aquário do Rio de Janeiro foi o primeiro aquário do mundo todo a ter reprodução da raia borboleta, que é uma das espécies mais ameaçadas do planeta. Foram duas reproduções que geraram quatro filhotes para cada uma, os quais estão vivos até hoje, e a fêmea já está grávida de novo.
7- Como biólogo marinho, o senhor tem alguma espécie pela qual possui mais interesse?
R: A espécie que mais me atraiu sempre foi o tubarão. Então, por isso, eu passei a mergulhar com eles. Mergulhei com quase todos em vários lugares do mundo. Mergulhei com o tubarão branco, o cabeça-chata e o tigre que são as três espécies tidas como as mais perigosas e, efetivamente, são as que mais têm registros de ataques. Fiz exatamente para desmistificar essa imagem errada que o tubarão tem e mostrar que ele é importantíssimo para a conservação da natureza, mantendo equilibrado o ecossistema marinho. Então, com certeza, são os tubarões os seres de maior interesse de minha parte e evidente que são, entre os habitantes do aquário, os seres que mais atraem a atenção das pessoas.
8- De que forma a pandemia do Covid-19 impactou na rotina do AquaRio como um todo?
R: Teve impacto em todos os negócios no Brasil e no mundo. O aquário ficou fechado durante quatro meses. Agora, é importante que se diga que, todos os dias, quando o público vai embora, ele não fecha, continua funcionando porque tem que filtrar quatro milhões e meio de litros de água por hora, durante vinte quatro horas diárias, para manter a água equilibrada, saudável, e os peixes têm que ser alimentados e cuidados. Isso acontece por uma equipe que trabalha o tempo todo. Então, quando o aquário fecha às 18h, o grande custo de energia continua. Sendo assim, mesmo com a pandemia e o AquaRio fechado por quatro meses, os custos continuaram, mas, como tem um grupo muito forte apoiando, conseguiu sobreviver tranquilamente, sem grandes problemas.
9- O senhor participou de uma expedição à ilha de Trindade, o que resultou em um novo recinto no AquaRio para abrigar apenas espécies daquela área. Qual foi o critério para a escolha das espécies coletadas e o que esse tanque, em particular, representa para estudantes e biólogos marinhos?
R: Essa expedição teve como objetivo criar um novo recinto no aquário, o que foi feito. Então, a ideia era criar um aquário que representasse e mostrasse o fundo que existe em Trindade e as espécies que lá vivem. Assim, trouxemos algumas espécies de lá; outras, a gente adquiriu ou pescou aqui; e, então, montamos o aquário com essas espécies para mostrar para a população, para a sociedade o que representa a ilha de Trindade, quais são os projetos que existem lá, projetos de pesquisa, a importância da ilha para o Brasil etc.
10- No ano de 2017 foi assinado um termo de cooperação do AquaRio com o Instituto Rumo ao Mar (RUMAR). O senhor poderia descrever como esse termo funciona na prática e qual a importância do mesmo para ambas as entidades?
R: Esse termo de cooperação entre o AquaRio e o Rumar viabilizou um espaço para a Marinha do Brasil no aquário que tem como objetivo apresentar várias coisas que a marinha faz. E vem fazendo isso de forma muito boa, tanto que, muitas vezes, o stand da marinha é mais visitado do que os outros. Acho isso importante para ambos os lados, não só para o aquário que tem mais uma atração, como para Marinha do Brasil que tem um local no Rio de Janeiro para mostrar suas atividades, pesquisas e operações.
11- Em suma, quais suas perspectivas para o futuro do AquaRio?
R: Acho que o futuro do aquário marinho do Rio de Janeiro é continuar trabalhando nesse tripé de educação, pesquisa e conservação. Educando as pessoas, mostrando para a juventude, dando acesso às crianças que não tem recursos – porque a gente recebe todas as crianças de escolas públicas de graça, ainda que o aquário seja privado, dando a oportunidade a essas crianças de conhecerem os ecossistemas marinhos, sua importância e a beleza desses ecossistemas para, quem sabe, algumas dessas tenham o “click” que eu tive e venham a se tornar novos cientistas, novos biólogos marinhos etc. Também, continuar a fazer as pesquisas – que são importantíssimas – e, especialmente, trabalhar pela conservação dos oceanos, o que é cada vez mais importante para manter esse patrimônio mundial que é esse mar azul – três quartos do planeta – o qual é preciso preservar.
Saiba mais em: <https://rumoaomar.org.br/mentalidade-maritima/trindade-a-primeira-fronteira.html>
Jornalista responsável: Flavio Porto começou como jornalista trabalhando no primeiro provedor de internet do Rio de Janeiro, o Inside Information Systens (IIS) nas funções de webmaster, editor e redator da página principal e do seu site sobre jogos eletrônicos, o “jogos.com.br”, além de trabalhar como colaborador na revista mensal “Mundo dos Jogos”. Após aprovação em concurso, passou a integrar a revista do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro como jornalista e repórter fotográfico. Depois, atuou por alguns anos como chefe do antigo Serviço de Comunicação e Identidade Visual do mesmo Tribunal. Também fez uma exposição literária-fotográfica no Museu da Justiça do TJRJ durante esse período. Atualmente, escreve para o Rumar.org.br, voluntariamente.
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